Petrobras deve indenizar trabalhadora que teve transtornos psicológicos por pressão no trabalho

Mesmo sabendo que um dos princípios da administração pública é a eficiência, não se pode esquecer que há regras de proteção ao ambiente de trabalho que limitam o poder do empregador de cobrar resultados de seus empregados além de seus limites individuais. Com esse argumento, a juíza Martha Franco de Azevedo, em exercício na 21ª Vara do Trabalho de Brasília, condenou a Petrobras Distribuidora S/A a pagar indenização no valor total de R$ 40 mil, a titulo de danos morais e existenciais, a uma empregada que sofreu com transtornos psicológicos por conta da pressão sofrida no ambiente de trabalho.

Na reclamação trabalhista, a trabalhadora relata que enfrentou transtornos psicológicos e psiquiátricos, que teriam sido causados devido à tensão decorrente da falta de regras e padronização na rotina organizacional da empresa, situação com a qual conviveu desde sua admissão por concurso público em 1998, e que se agravou com a sua transferência do Rio de Janeiro para Brasília, quando o gerente ao qual foi subordinada lhe atribuiu um tratamento inadequado, respaldado em pressões, decorrentes do elevado grau de responsabilidade daquela gerência, aliado à desorganização do serviço e falta de clareza das atividades a serem desempenhadas o que persistiu ao longo dos anos.

Ela revela que sofreu sobrecarga de trabalho com a mudança da presidência da empresa, quando passou a acumular funções, com a implantação de quatro projetos, o que ensejava sua participação em viagens, treinamentos, elaboração de relatórios, atividades com conteúdo não somente operacional, mas decisório e estratégico, sobrecarga de trabalho com cumprimento de jornada elevada, quando começou a sentir os primeiros sintomas e com os afastamentos motivados por seu estado de saúde, passou a ser perseguida pelo superior hierárquico, como ocorreu quando foi impedida de visitar a mãe doente, antes de seu falecimento, entre outros fatores. Ela diz que esse quadro levou a seu afastamento do trabalho, a partir do ano de 2005, em gozo de benefício previdenciário.

A empresa negou todas as alegações da trabalhadora. Por seu advogado, revelou que a Petrobras Distribuidora se pauta pelo atendimento e relacionamento de forma mais ordeira possível. fala de adoção de modelo de gestão alinhado às mais modernas referências de administração eficiente focada em resultados, para garantir serviços públicos de qualidade à sociedade, não havendo conduta que desabone gestão pautada em metas.

Laudo previdenciário

Em sua decisão, a magistrada salientou que o laudo de perícia médica nos autos de processo na Vara de Ações Previdenciárias do Distrito Federal – que levou ao afastamento da trabalhadora – concluiu que a autora da reclamação era portadora de distúrbios psiquiátricos e, em que pese não pudesse confirmar que tais distúrbios tenham sido originados pelas atividades laborativas pregressas, “pelo discurso coerente apresentado pela pericianda” naquela perícia, concluiu que a doença psiquiátrica pode ter sido agravada pelas condições relatadas como ocorridas no ambiente de trabalho.

O laudo em questão, prosseguiu a juíza, foi acolhido pelo magistrado sentenciante naqueles autos, que julgou parcialmente procedente o pedido feito naquela instância, diante do reconhecimento da natureza ocupacional das enfermidades incapacitantes, valendo-se da constatação dos peritos de que as queixas da autora seriam decorrência das “dificuldades enfrentadas ao longo da sua vida produtiva, desencadeadas pelas exigências pessoais de competência, pelo excesso de responsabilidades e pelo acúmulo de tarefas laborais”.

Já a perita nomeada no processo que tramita na Justiça do Trabalho disse que, com base na análise da documentação referente à trabalhadora, sua anamnese, as provas dos autos e o exame pericial, existe o nexo causal entre a moléstia e o modo de desempenho do trabalho na Petrobras. Quanto à capacidade laborativa, frisou que, embora a trabalhadora tenha experimentado redução total da capacidade laborativa no ápice das patologias apresentadas, quando se afastou em gozo de benefício previdenciário, no momento presente está restabelecida e trabalhando na empresa, ainda que em menor escala tenha seus sentidos psíquicos comprometidos. A perita concluiu pelos diagnósticos de depressão e traços de Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), estabelecendo nexo causal por considerar, sobretudo, o relacionamento com o gerente como fator decisivo para a eclosão da doença. A conclusão também levou em consideração laudos médicos juntados aos autos, em que a autora relatou problemas de relacionamento com o chefe, em 2003.

De acordo com a magistrada, ainda que não se considere comprovados todos os fatos descritos na inicial referentes à suposta perseguição pelo chefe, inexistindo prova de prática de assédio moral, pode-se verificar que há elementos que demonstram que a trabalhadora foi submetida não só ao tratamento autoritário vislumbrado pela perita, como também a situações de estresse, pelo excesso de trabalho, prática de horas extras, imposição e cobrança de metas, do que resultou afastamento pelo INSS de 2005 a 2009.

Gestão

Após ouvir diversos depoimentos durante a instrução processual, a magistrada ressaltou que “se uma gestão pautada em resultados e metas realmente não compreende um ilícito, quando um dos princípios da administração pública é a eficiência, não podemos nos esquecer que há regras de proteção ao ambiente de trabalho que limitam o poder do empregador de cobrar resultados de seus empregados além de seus limites individuais, desde que tal conduta não implique em seu adoecimento. Local de trabalho é onde o empregado deve ganhar a vida e não, perdê-la”.

A Petrobras fala em eficiência administrativa, mas em momento algum demonstra ou alega em sua defesa que atendia normas regulamentares do Ministério do Trabalho que tratam da segurança e da saúde dos trabalhadores, para conhecer ou mapear os problemas de suas unidades administrativas, de modo a adotar medidas eficientes para prevenir doenças ou acidentes de trabalho, afirmou a juíza. “Ou seja, a Reclamada fala em gestão por resultados, técnica que constitui modelo de eficiência no mundo corporativo e competitivo dos dias atuais. Todavia, em momento algum demonstra que a busca pela qualidade empresarial tem também em mente a saúde física e mental de seus empregados, não havendo notícia de programas ou ações na busca da melhoria das condições ambientais no trabalho, mormente à época do adoecimento da Reclamante, com cuidados quanto à organização da rotina de trabalho, de modo a evitar o comprometimento de saúde de seus colaboradores”.

Ao fixar em R$ 30 mil a indenização por danos morais e em R$ 10 mil por danos existenciais, a magistrada concluiu que “da temporária e total redução da capacidade laborativa da Reclamante, ainda que recuperada, no tocante aos transtornos de ordem psicológica/psiquiátrica, resulta dano moral, posto que o sofrimento foi identificado como decorrente de circunstâncias em que o trabalho foi desempenhado. E o dano moral, no presente caso, tem também cunho existencial, porque a doença relatada compreendeu um transtorno na vida da empregada, privando-a do convívio social, familiar ou profissional, pelos quatro anos de afastamento do trabalho em gozo de benefício previdenciário para tratamento e recuperação de sua saúde mental”.

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região Distrito Federal e Tocantins, por Mauro Burlamaqui, 22.02.2016

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